Com o avanço da modernidade, as pessoas passam a tentar administrar seu tempo da melhor forma possível. O ritmo frenético das grandes cidades exige cada vez mais responsabilidades de nossa parte e como resultado, acabamos tendo a sensação que não dispomos de tempo suficiente para fazer tudo. Entretanto, os grandes centros urbanos nunca param e há serviços que estão disponíveis 24 h por dia. Inclusive academias de ginástica! Há quem só consiga fazer seu treino às altas horas da noite e até mesmo à madrugada. Já outros optam por começar o dia com uma sessão de treinamento antes do horário de trabalho. De um modo geral, as pessoas fazem atividade física nos horários mais diversos do dia, mas aí fica a pergunta:“Existe um horário adequado para o treino de musculação?”
Esta indagação certamente já foi feita por vários praticantes de musculação. Realmente há um momento ideal durante o dia para treinar? E, se de fato existe esse horário, qual a razão? O que faz com que, em determinado horário, o treino apresente mais rendimento que em outro? Para responder estes questionamentos, vamos primeiro entender um pouco melhor da capacidade bioenergética.
Nosso corpo é uma máquina altamente especializada em produzir energia. Para se ter uma idéia, nos processos de obtenção de energia pela célula, existe um rendimento líquido de 45% do substrato inicial, sendo o restante dissipado na forma de calor. Em outras palavras, a célula aproveita aproximadamente metade do combustível que lhe é fornecido na forma de energia. Acha pouco? Compare esta capacidade com a do motor de um automóvel, onde se aproveitam apenas cerca de 25% e entenderá o porquê da célula humana ser umas das mais eficientes produtoras de energia.
PROCESSOS DE OBTENÇÃO DE ENERGIA
Em nosso organismo, a obtenção de energia se dá por três etapas distintas: 1) Fase alática ou dos fosfagênios – onde o sistema ATP-CP supre praticamente todas as necessidades imediatas de energia, não ocorrendo a formação de lactato; 2) Fase lática ou glicólise anaeróbia – aqui, a produção de energia supre os primeiros minutos da atividade, de acordo com a intensidade e demanda energética, ocorrendoo grande produção de lactato e íons de Hidrogênio, tornando o meio celular extremamente ácido e forçando a descontinuar o processo. Caso a demanda não seja tão grande, há a passagem para a próxima etapa, pela produção de piruvato; 3) Fase oxidativa ou glicólise aeróbia – neste momento, há a maior produção de energia, o piruvato formado na etapa anterior forma Acetil-CoA e entra no ciclo de Krebs, finalizando o processo na cadeia transportadora de elétrons. Aqui os ácidos graxos e certos aminoácidos também podem ser utilizados como substrato energético, ao serem convertidas em Acetil-CoA para posteriormente entrar no ciclo de Krebs.
Como podemos observar, os processos iniciais de formação de energia (aqui, destacando a bioenergética da célula muscular), há uma rápida requisição de energia que obedece à intensidade adotada na atividade. Quando se realizam trabalhos onde há contração vigorosa da fibra muscular, praticamente as duas primeiras etapas citadas anteriormente estão envolvidas no processo. Antes acreditava-se que APENAS um tipo de etapa supria a energia em sua respectiva fase, hoje se sabe que todas as fases ocorrem ao mesmo tempo, porém em percentuais bastante variados. Em relação à tipologia das fibras musculares, especialmente as fibras do tipo II (contração rápida, brancas) estão envolvidas na prática da musculação. Neste tipo de atividade, a quase totalidade da energia produzida é anaeróbia. Isto coloca a musculação como uma atividade eminentemente GLICOLÍTICA. Mas o que isto quer dizer? Simples: o principal substrato para a musculação é GLICOSE, sendo esta por sua vez, fornecida pelos depósitos de glicogênio contido nos músculos.
NECESSIDADES ENERGÉTICAS DA MUSCULAÇÃO
Com base nesta informação podemos afirmar que o glicogênio muscular é o maior fornecedor de energia na musculação, porém não é o único. Glicose sérica (presente no sangue) e proveniente do glicogênio hepático também podem contribuir para o processo, em proporções bem menores. Entretanto, ainda há outras fontes alternativas de energia para suprir esta demanda. Quando não há glicose suficiente, o tecido muscular cede o aminoácido alanina – formado através de transaminação – para ser desaminado pelo fígado para formar glicose extra. A este processo é dado o nome de ciclo glicose-alanina. Também a produção de Lactato, através do ciclo de Cori, pode ser direcionada para a reconversão em piruvato e assim gerar glicose.
Que conclusão podemos tirar destas assertivas? Ora, se a musculação é assistida principalmente por carboidratos, e em determinadas condições pode ser proveniente dos aminoácidos do tecido corporal, temos que atentar quais os momentos do dia em que há maior abundância deste substrato a fim de atender as necessidades do treino.
QUAL É ENTÃO O HORÁRIO IDEAL PARA O TREINO?
Neste caso, devemos ter certa cautela em fazer tal afirmação, haja visto que a pergunta é cercada de ambiguidade e depende de várias outras premissas. Em uma situação geral, poderíamos dizer que o melhor momento para exercer atividades desta natureza seria o horário compreendido entre as primeiras horas da tarde até aproximadamente 8 h da noite. Isto, evidentemente, baseado em uma rotina típica de alguém que acorda às seis ou sete da manhã e que dorme aproximadamente às dez ou onze da noite.
Neste período, estima-se que os níveis de glicogênio hepático e muscular estejam adequados, salientando que a glicogênio muscular em um homem adulto de porte médio é de aproximadamente 350 gramas, podendo chegar até 500 g num indivíduo treinado. Uma vez que o GM não atende a outras necessidades energéticas a não ser do próprio tecido muscular, cabe ao glicogênio hepático fornecer energia para o funcionamento cerebral. Porém, como seus estoques são pequenos (algo em torno de 100 a 120 g), podem ocorrer variações na glicemia sérica, principalmente durante a atividade física realizada sem a devida atenção alimentar.
Isto explica o porquê de muitas pessoas sentirem hipoglicemia ao realizarem um treino de musculação cedo, pela manhã. Os níveis de GM podem até estar adequados, porém a quantidade de glicogênio hepático está diminuída, o que faz com que a glicose sanguínea encontre-se abaixo do ideal. Ocorre então, hipoglicemia por deficiência de glicose para o metabolismo cerebral, não muscular. Outro engano é alimentar-se pela manhã e logo em seguida ir à academia. A não ser que sua refeição seja composta exclusivamente de carboidratos de fácil assimilação, começará o treino sem a efetiva contribuição dos nutrientes da refeição, ou seja, estará perfazendo a atividade em jejum. Hipoglicemia, muito provavelmente, poderá ocorrer.
Alguns podem até dizer: “Já estou acostumado a comer ao acordar e logo em seguida ir treinar!” Para esses pretensos experts em nutrição esportiva, isto funciona, pois não relatam sentir hipoglicemia. De certa forma, funciona – só que à duras custas. Provavelmente estes indivíduos – o corpo humano se adapta à tudo – tem uma produção tão eficaz de energia oriunda do ciclo glicose-alanina, que chega a atender as suas necessidades. Quanta ironia: treinar às custas da energia do próprio tecido muscular…
OUTRAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES
Até agora, abordamos apenas a questão bioenergética, mas vamos pensar de uma maneira mais abrangente. Quando acordamos, o metabolismo de cada tecido leva algum tempo para atingir seu nível ótimo de funcionamento. Ou seja, você demora algumas horas para “despertar” completamente. Esta é uma das razões pelas quais você está mais letárgico pela manhã. Lembrem-se, estamos falando de uma pessoa com hábitos usuais do dia-a-dia. O ritmo circadiano de uma pessoa que costuma levantar às três da manhã ou às onze da manhã é bem diferente; e mais ainda o de quem troca a noite pelo dia! Estas situações são um caso a parte.
Voltando ao nosso exemplo, também não seria interessante treinar muito tarde e dormir logo em seguida, pois aí nos depararíamos com uma faca de dois gumes. Uma vez que é necessário fazer uma refeição pós-treino rica em carboidratos e proteínas, esta também poderia inibir drasticamente a secreção de hormônio do crescimento durante o sono. Lembrem-se: grandes quantidades de alimento liberam somatostatina, que interfere na liberação do GH. Teríamos então, que escolher em alimentar os músculos (necessidade REAL) ou não atrapalhar a secreção de GH. Na dúvida, o melhor seria comer após o treino e esperar algumas horas para somente então dormir.
Todas estas situações descritas acima são baseadas nos fenômenos bioenergéticos que ocorrem durante a atividade física e, neste sentido, nos dão algum norte para que escolhamos o melhor horário para nos exercitarmos. De um modo geral, cada um se adapta às condições impostas pelo meio, mas este processo é lento e dispendioso para o organismo. Então, se é possível escolhermos um horário onde nosso rendimento seja o melhor possível, façamos isto conscientemente!
BONS TREINOS E ATÉ A PRÓXIMA!
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2 comentários:
li um outro artigo nesse site que praticamente faz apologia do treino aerobico em jejum como forma de perder gordura sem prejuizo do ganho muscular.isso nao parece contraditorio com o artigo em tela ? confesso que fiquei com a sensaçao de ler artigos contraditorios.
A bioenergética da musculação é eminentemente glicolítica (anaeróbia), portanto, requer níveis adequados de glicogênio muscular e hepático; já a atividade aeróbia (de BAIXA A MODERADA INTENSIDADE, como está bem descrito no texto citado) se faz em sua maior parte OXIDATIVA, especialmente dos ácidos graxos. Fazer um treino de musculação em jejum, é portanto, totalmente catabólico e psssivo de severa hipoglicemia...
Abraço!
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